quinta-feira, 20 de março de 2008

Os picos do Ouriço

Um das coisas mais inquietantes do português é o seu estado de espírito. Quando perguntamos a um português "como está", muito raramente se obtém uma resposta linear como um "bem obrigado". É um caso raro. A pergunta imposta faz-se sempre acompanhar por um "vamos andando", "mais ou menos", "sabe como é, umas coisas hoje, outras amanhã" ou o característico "assim, assim". A coisa, com o decorrer dos anos e as mudanças no estado socio-político-económico nacional, torna-se exasperante. Cansa. A explicação está na estóica alma lusa, habituada a sofrer, habituada à bravura inefável dos ancestrais marinheiros, resistentes ao sal, ao mar e ao escorbuto. Está no fado do desgraçadinho, da saudade e do culto da doentia ciumeira, que consequentemente leva ao mal de amor, ao engano, ao "ai valha-me Deus que amor não me enganas". Está no saudosismo. Está no fomos grandes e já não somos. Está na crítica fácil e corriqueira. Aqui mais do que em qualquer outro factor. Faz-se bem? Critica-se. Faz-se mal? Critica-se também. Tem cão? Vai preso. Não tem cão?? Homessa, vai preso também. Aqui reside a essência do mal nacional. Critica e medo de mudança. Quando vamos ao Brasil, por exemplo, está sempre tudo bem. Têm Lula, têm sol, têm fome - têm muita fome -, têm corrupção, têm miséria, têm miséria aos montes, foram ouro, foram colonizados décadas a fio, foram escravizados décadas a fio. No entanto, para eles, está "tudo jóia", "beleza", "tudo em cima". Porquê? Porque Deus concedeu-lhes o dom da vida. Só. Simplesmente. E eles vivem a alegria de estarem vivos. Só. Simplesmente. Com um qualquer "chope", sorriem e agradecem a vida.

Ouriço

1 comentário:

Alentejana de Olhos de Água disse...

Muito bem dito e muito bem escrito.
Apoiado Ouriço.
beijocas