Numa altura em que não temos grandes motivos para sorrir - coisas da crise - nada como ler este texto do Ricardo Araújo Pereira.
De levar às lágrimas!
Não digo que os móveis do IKEA não sejam baratos. O
que digo é que não são móveis. Na
altura em que os compramos, são um puzzle. A questão, portanto, é saber se o
IKEA vende móveis baratos ou puzzles caros.
Os problemas
dos clientes do IKEA começam no nome da loja.
Diz-se «Iqueia» ou «I quê à»? E é «o» IKEA ou «a» IKEA»?
São ambiguidades que me deixam indisposto. Não saber a pronúncia correcta do nome da loja em que me encontro
inquieta-me. E desconhecer o género a que pertence gera em mim uma insegurança
que me inferioriza perante os
funcionários. Receio que eles percebam, pelo meu comportamento, que julgo estar
no «I quê à», quando, para eles, é evidente
que estou na «Iqueia».
As dificuldades, porém, não são apenas semânticas mas também conceptuais.
Toda a gente está convencida de que o IKEA vende móveis baratos, o que não é exactamente verdadeiro. O IKEA vende
pilhas de tábuas e molhos de parafusos que, se tudo correr bem e Deus ajudar,
depois de algum esforço hão-de
transformar-se em móveis baratos. É uma espécie de Lego para adultos.
Há dias, comprei no IKEA um móvel chamado Besta. Achei que combinava bem com a minha personalidade. Todo o
material de que eu precisava e que tinha de levar até à caixa de pagamento
pesava seiscentos quilos.
Percebi melhor o nome do móvel. É preciso vir ao IKEA com uma besta de carga para carregar a tralha toda até à
registadora.
Este é um dos meus conselhos aos clientes do IKEA: não vá para lá sem duas ou três mulas. Eu alombei com a meia
tonelada.
O que poupei nos móveis, gastei no ortopedista. Neste momento, tenho doze estantes e três hérnias. É claro que há
aspectos positivos: as tábuas já vêm cortadas, o que é melhor do que nada. O
IKEA não obriga os clientes a irem para
a floresta cortar as árvores, embora por vezes se sinta que não faltará muito
para que isso aconteça. Num futuro próximo,
é possível que, ao comprar um móvel, o cliente receba um machado, um serrote e
um mapa de determinado bosque na Suécia onde o IKEA
tem dois ou três carvalhos debaixo de olho que considera terem potencial para se transformarem numa mesa-de-cabeceira engraçada.
Por outro lado, há problemas de solução difícil. Os móveis que comprei chegaram a casa em duas vezes.
A equipa que trouxe a primeira parte já não estava lá para montar a segunda, e a equipa que trouxe a segunda
recusou-se a mexer no trabalho que tinha sido iniciado pela primeira.
Resultado: o cliente pagou dois transportes e duas montagens e ficou com um móvel incompleto. Se fosse um cliente
qualquer, eu não me importaria. Mas como sou eu, aborrece-me um bocadinho. Numa
loja que vende tudo às peças (que, por
acaso, até encaixam bem umas nas outras) acaba por ser irónico que o serviço de
transporte não encaixe bem no serviço
de montagem. Idiossincrasias do comércio moderno. Que fazer então? Cada cliente
terá o seu modo de reagir. O meu é este: para a próxima,
pago com um cheque todo cortado aos bocadinhos e junto um
rolo de fita gomada e um livro de instruções. Entrego metade dos confetti num dia e a outra metade no outro.
E os suecos que montem tudo, se quiserem receber.
E já agora sobre o IKEA:
Uma senhora vai ao Ikea comprar um armário novo. Para que lhe saia mais barato, compra um em kit. Ao chegar a
casa, monta-o e fica perfeito.
Nesse momento passa o comboio (ela mora junto à estação de comboios) e o armário desmonta-se todo.
Monta novamente o armário. E este volta a cair com o passar do comboio. À terceira tentativa falhada,
telefona para a Ikea e exige a presença
de um técnico.
O técnico chega, monta o armário e, quando passa o comboio, desmonta-se todo. O técnico monta novamente
o armário, passa outro comboio e, armário novamente desmontado. Então, o
técnico tem uma brilhante ideia:
Escute, minha senhora, eu vou montar novamente o armário, meto-me lá dentro e espero que passe o comboio para ver
porque é que o armário se estás desmontar. E assim fez.
Nisto o marido entra no quarto e diz:
- Querida, que armário tão bonito! - e abre a porta. Ao ver o técnico da Ikea pergunta:
- O que é que você faz aí?
Este responde: - Estou quase tentado a
dizer-lhe que vim comer a sua mulher. Porque, se
lhe digo que estou à espera do comboio, não vai acreditar.
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